♪ Em 1981, o cantor João Gilberto (1931 – 2019) lançou álbum, Brasil, gravado com Caetano Veloso, Gilberto Gil e Maria Bethânia. Dez anos antes deste disco do fantástico quarteto baiano, um outro álbum poderia ter reunido João com Caetano e com a conterrânea Gal Costa, cantora discípula da bossa do inventor da batida diferente.
Em 1971, o produtor musical Manoel Barenbein recebera a incumbência de André Midani (1932 – 2019) – executivo que comandava a filial brasileira da gravadora Philips – de dar forma a um disco do trio com o áudio do especial gravado por João com Caetano e Gal para a TV Tupi em agosto daquele ano de 1971 e exibido pela emissora em outubro.
O programa foi ao ar. Só que o projeto do disco foi logo abandonado diante do veto do perfeccionista João, permitido por cláusula contratual.
A novidade é que, mesmo sem disco, dois terços da hora e meia da gravação exibida na TV já podem ser ouvidos na internet. O pesquisador musical Pedro Fontes teve acesso a números do especial e, após ter dado tratamento na gravação, disponibilizou o material no YouTube em duas partes, cada uma com meia hora.
O registro tem importância documental e musical porque, além do encontro em si, a gravação – feita em dois dias, no estúdio da Tupi no bairro do Sumaré, na cidade de São Paulo (SP) – marcou a volta (então temporária) de Caetano do exílio em Londres (o artista somente retornaria ao Brasil, em caráter definitivo, em 1972).
De acordo com os créditos do YouTube, o áudio da gravação procede da fita pertencente a Ion de Freitas Filho. Outra fita com a gravação era de Cyro Del Nero e tinha sido doada por Nero a Fundação Padre Anchieta. Cyro Del Nero trabalhou como um dos produtores do especial de TV, dirigido por Fernando Faro (1927 – 2016).
No material disponibilizado no YouTube, o maior destaque é a gravação de Ao voltar do samba (Synval Silva, 1934) – samba lançado na voz de Carmen Miranda (1909 – 1955) – com a voz de Gal e o violão de João.
Com esse acompanhamento luxuoso, Gal também canta o samba Falsa baiana (Geraldo Pereira, 1944), Meditação (Antonio Carlos Jobim e Newton Mendonça, 1959) e a canção Baby (Caetano Veloso, 1968).
Caetano rumina a toada Asa branca (Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, 1947) no tom da gravação feita para o álbum londrino Caetano Veloso (1971), lançado naquele mesmo ano, e se junta a Gal no canto de Saudosismo (Caetano Veloso, 1968), música que compusera em tributo a João.
O papa da bossa sola Desafinado (Antonio Carlos Jobim e Newton Mendonça, 1959), o samba Chega de saudade (Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes, 1958) – marco da revolução feita por João em 1958 com a voz e violão diferente do artista – e a canção Retrato em branco e preto (Antonio Carlos Jobim e Chico Buarque, 1968).
Sozinho, Caetano canta Na asa do vento (João do Vale e Luiz Vieira, 1956) – música que gravaria dali a quatro anos no álbum Joia (1975) – e Fruta gogoia, tema do folclore baiano que faria parte do roteiro do show Fa-Tal – Gal a todo vapor (1971 / 1972), espetáculo que Gal estrearia em outubro, mês de exibição do especial na TV Tupi.
No fim do material disponibilizado, João se une a Caetano e a Gal para degustar o samba Você já foi à Bahia? (Dorival Caymmi, 1941) em número de quase sete minutos. Na sequência, João revisita Largo da Lapa (Wilson Baptista e Marino Pinto, 1942) na companhia de Gal.
Novamente sozinho, Caetano deu voz a duas composições autorais lançadas em discos alheios naquele ano de 1971, De noite na cama (1971) – música que dera para Erasmo Carlos – e A tua presença morena, faixa que inspirou o título do álbum de estúdio gravado por Maria Bethânia.
Você já foi conferir o material desse especial que, infelizmente, nunca virou disco? Não? Então vá...