♪ MEMÓRIA – Na certidão de nascimento, ele foi José Ribamar Ferreira (10 de setembro de 1930 – 4 de dezembro de 2016), nome que explicitava a origem maranhense. Na assinatura dos poemas, ele foi, é e será eternamente Ferreira Gullar, criador de versos que puseram em pauta questões sociais, políticas e existenciais que fizeram do autor um dos maiores nomes da literatura brasileira.
Os versos de Ferreira Gullar ressoam na música brasileira 90 anos após o nascimento do poeta, em relação com a palavra (en)cantada iniciada em 1966 por Nara Leão (1942 – 1989), cantora visionária que deu voz a poema de Gullar musicado por Denoy Oliveira, Como dois e dois são quatro, no álbum Manhã de liberdade (1966).
Nada menos do que 30 músicas ostentam versos de Ferreira Gullar. A maioria dessas 30 músicas ostentam versos anteriores às melodias. Versos que ganharam músicas sob a inspiração de compositores como Milton Nascimento – parceiro de Gullar em Bela bela e Meu veneno, músicas lançadas em 1981 e 1990 nas vozes de Milton e da cantora Selma Reis (1958 – 2015) , respectivamente – e Raimundo Fagner, este o mais frequente parceiro de Gullar.
E há versos escritos por Gullar especialmente para virarem música. A letra de Onde andarás, por exemplo, foi escrita pelo poeta a pedido de Maria Bethânia. A cantora queria letra sobre amor ausente, doído, uns versos de fossa. Gullar escreveu Onde andarás, letra que ganhou música de Caetano Veloso, lançada pelo cantor em 1968 e regravada por Bethânia duas vezes, a primeira em 1969 e a segunda em 1988, em sublime registro interiorizado do álbum Maria.
Em 1975, invertendo a ordem habitual da criação, Gullar escreveu versos para a melodia de d'O trenzinho do caipira, tema composto em 1930 pelo compositor Heitor Villa-Lobos (1887 – 1959). Coube a Edu Lobo lançar a letra de Gullar em gravação de 1978 que impulsionou a obra musical do poeta.
Parceiro de Adriana Calcanhotto (compositora que musicou versos lúdicos do poeta para ganharem a voz do heterônimo infantil Adriana Partimpim em show de 2004), Flavia Bittencourt (Um instante, 2012), Moacyr Luz (Poema obsceno, 2005), Paulinho da Viola (Solução de vida, 1996) e Sueli Costa (Escuta moça, 1984).
Contudo, foi mesmo com Fagner que a poesia de Ferreira Gullar virou palavra cantada pelo Brasil com maior frequência. Um dos poemas mais celebrados de Gullar, Traduzir-se virou música que deu nome ao álbum lançado em 1981 pelo cantor e compositor cearense.
Na sequência, Fagner musicou Contigo (1983), Me leve (Cantiga para não morrer) (1984) – canção que se tornou sucesso – e Rainha da vida (1986), além de Menos a mim (1991), música do álbum, Pedras que cantam, em que o cantor apresentou Borbulhas de amor (1991).
Com Borbulhas de amor, Ferreira Gullar caiu na boca do povo brasileiro, através da voz de Fagner, ao escrever a versão em português de Burbujas de amor (1990) composição de Juan Luis Guerra traduzida pelo poeta com fidelidade ao sentido dos versos originais em espanhol do artista dominicano.
Como grande poeta, Ferreira Gullar sabia que as almas necessitam de ilusão.